Lira critica indiciamentos de deputados pela PolĂ­cia Federal

Com citaçÔes Ă  cassação do deputado MĂĄrcio Moreira Alves durante a ditadura militar (1964-1985), o presidente da CĂąmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), saiu em defesa dos deputados federais Marcel van Hattem (Novo/RS) e Cabo Gilberto Silva (PL/PB) na noite desta terça-feira (26). Ambos foram indiciados pela PolĂ­cia Federal (PF) por calĂșnia e difamação contra um delegado da PF em discursos proferidos na tribuna do Parlamento.

O presidente da CĂąmara destacou que nĂŁo entra no mĂ©rito da fala dos parlamentares, mas ressaltou que os discursos na tribuna da CĂąmara nĂŁo podem ser cerceados, e citou o caso do deputado Moreira Alves, cassado depois de proferir discurso, em 1968, denunciando a ditadura. Dias depois, o regime editou o Ato Institucional nÂș5 (AI-5), suspendendo os direitos e garantias polĂ­ticas e individuais no paĂ­s.

“Recordo aqui o caso do deputado Moreira Alves, que, durante o regime militar, foi alvo de retaliação justamente por sua coragem em defender a democracia e os direitos dos cidadãos. Sua cassação, baseada em discursos feitos na sagrada tribuna desta Casa, marcou um dos episódios mais sombrios de nossa história legislativa e serve como um alerta constante para nós. Aqueles que tentam restringir nossa liberdade de expressão legislativa desconsideram os danos profundos que essa prática causa ao Estado Democrático de Direito”, afirmou Lira.

O presidente da CĂąmara disse ainda que vĂȘ com grande preocupação o indiciamento dos parlamentares por discursos proferidos na tribuna, defendeu a imunidade material dos deputados e afirmou que tomarĂĄ medidas para defender as prerrogativas da Casa.

“NĂŁo se pode cercear o direito fundamental ao debate e Ă  crĂ­tica em tribuna, mediante ameaças de perseguição judicial ou policial. O Parlamento nĂŁo Ă© e nĂŁo pode ser alvo de ingerĂȘncias externas que venham a coibir o exercĂ­cio livre do mandato”, destacou o presidente da CĂąmara, acrescentando que “nossa voz Ă© a voz do povo, e ela nĂŁo serĂĄ silenciada”.

CalĂșnia e difamação

O deputado Marcel van Hatten disse que foi indiciado por calĂșnia e difamação ao afirmar, em agosto deste ano, que o delegado FĂĄbio Alvarez Shor estaria fraudando as investigaçÔes contra o ex-assessor da PresidĂȘncia no governo Jair Bolsonaro, Filipe Martins, preso por suposta tentativa de golpe de Estado.

“Eu quero que as pessoas saibam, sim, quem Ă© esse dito policial federal que fez vĂĄrios relatĂłrios absolutamente fraudulentos contra pessoas inocentes, inclusive contra Filipe Martins”, afirmou da tribuna Hatten enquanto segurava uma foto do delegado da PF.

O deputado Cabo Gilberto Silva disse que tambĂ©m foi indiciado por “denĂșncias na tribuna da CĂąmara dos Deputados sobre a conduta do delegado FĂĄbio, que estĂĄ Ă  frente de vĂĄrios inquĂ©ritos ilegais contra inocentes brasileiros”.

Procurada, a Polícia Federal informou que não se manifesta sobre investigaçÔes em curso. 

Art. 53

O deputado Arthur Lira e os deputados indiciados citam, em suas defesas, o Artigo 53 da Constituição, que define que “os deputados e senadores sĂŁo inviolĂĄveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniĂ”es, palavras e votos”.

A jurisprudĂȘncia do Supremo Tribunal Federal (STF), no entanto, prevĂȘ alguns limites Ă  imunidade parlamentar. No inquĂ©rito que apura a suposta organização criminosa criada para atacar o STF e o processo eleitoral brasileiro, o chamado inquĂ©rito das fakes news, o ministro Alexandre de Moraes diz que “a jurisprudĂȘncia da Corte Ă© pacĂ­fica no sentido de que a garantia constitucional da imunidade parlamentar material somente incide no caso de as manifestaçÔes guardarem conexĂŁo com o desempenho da função legislativa ou que sejam proferidas em razĂŁo desta; nĂŁo sendo possĂ­vel utilizĂĄ-la como verdadeiro escudo protetivo para a prĂĄtica de atividades ilĂ­citas”.

Em outro julgamento, em 2020, o entĂŁo ministro do STF Marco AurĂ©lio afirmou que “a imunidade parlamentar pressupĂ”e nexo de causalidade com o exercĂ­cio do mandato”. 

“DeclaraçÔes proferidas em contexto desvinculado das funçÔes parlamentares nĂŁo se encontram cobertas pela imunidade material”, argumentou o ministro na ocasiĂŁo.

Em caso julgado em 2017, a ministra do STF Rosa Weber ponderou que “a verbalização da representação parlamentar não contempla ofensas pessoais, via achincalhamentos ou licenciosidade da fala”. 

Outras manifestaçÔes do STF sobre a imunidade parlamentar prevista no Art. 53 podem ser consultadas na pågina do STF.

AGÊNCIA BRASIL