STJ valida nervosismo como razĂŁo para abordagem e busca policial

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) validou, por 3 votos a 2, em julgamento realizado nessa terça-feira (16), a abordagem e a busca pessoal feita por policiais apĂłs suspeitarem apenas da reação de alguĂ©m ao vĂȘ-los.

O caso representa uma mudança no entendimento do colegiado, que nos Ășltimos anos vinha adotando posição mais rĂ­gida e anulando diversas buscas pessoais, veiculares e domiciliares realizadas sem mandado judicial, pois tinham como justificativa apenas alguma denĂșncia anĂŽnima ou a “intuição subjetiva” de policiais em sua atividade de rotina.

Em outras palavras, trata-se do famoso “baculejo” ou “enquadro”, como a prĂĄtica de revista pessoal e aleatĂłria por policiais Ă© popularmente conhecida no Brasil.

Contudo, ao julgar um habeas corpus (HC) nesta terça, a Sexta Turma formou nova maioria para validar uma condenação de cinco anos e seis meses de prisão por tráfico de drogas, que teve como ponto de partida uma abordagem policial justificada apenas pela “atitude suspeita” de um homem.

No caso concreto, policiais militares de GoiĂĄs relataram ter abordado o homem porque ele usava tornozeleira eletrĂŽnica e conversava com outra pessoa que estava em um carro e demonstrou nervosismo ao ver a viatura identificada. A atitude foi considerada suspeita pelos agentes.

Ao ser abordado, o suspeito confessou estar vendendo drogas e, segundo a polĂ­cia, autorizou a entrada dos agentes na residĂȘncia, onde entorpecentes foram encontrados.

O relator do caso, ministro Og Fernandes, considerou que houve “fundadas razĂ”es” para a abordagem policial, com base no contexto e no “nervosismo” do suspeito, e que o flagrante de drogas e a confissĂŁo de trĂĄfico ainda do lado de fora da residĂȘncia justificam a busca domiciliar feita sem mandado.


BrasĂ­lia (DF), 22/09/2023 - O ministro do STJ, Og Fernandes, durante a abertura do seminĂĄrio comemorativo dos 4 anos do Pacto Nacional pela Primeira InfĂąncia, no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Foto: Marcelo Camargo/AgĂȘncia Brasil
BrasĂ­lia (DF), 22/09/2023 - O ministro do STJ, Og Fernandes, durante a abertura do seminĂĄrio comemorativo dos 4 anos do Pacto Nacional pela Primeira InfĂąncia, no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Foto: Marcelo Camargo/AgĂȘncia Brasil

BrasĂ­lia (DF), 22/09/2023 – O ministro do STJ Og Fernandes entendeu que considerou que houve “fundadas razĂ”es” para a abordagem policial . Foto-arquivo: Marcelo Camargo/AgĂȘncia Brasil – Marcelo Camargo/AgĂȘncia Brasil

Og aplicou uma tese estabelecida em 2015 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), segundo a qual a entrada em domicĂ­lio sem mandado Ă© legal “quando amparada em fundadas razĂ”es, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito”.

Seguiram o relator os ministros Antonio Saldanha Palheiro e Carlos Pires Brandão, que tomou posse no cargo no fim de agosto e substituiu o desembargador convocado Otåvio de Almeida Toledo, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que atuava interinamente na Sexta Turma e mantinha posicionamento contrårio à abordagem policial baseada somente num julgamento subjetivo dos agentes de segurança.

Com o voto de Brandão, portanto, a Sexta Turma assumiu posição contråria à que vinha adotando desde 2022. Naquele ano, também no julgamento de um HC, o colegiado considerou ser ilegal qualquer revista pessoal justificada exclusivamente pela suspeita dos policiais sobre o comportamento de pessoas na rua.

DivergĂȘncia

Dessa maneira, os ministros SebastiĂŁo Reis JĂșnior e RogĂ©rio Schietti passaram a ficar vencidos na questĂŁo. Para eles, a reviravolta no entendimento da turma representa um retrocesso na garantia de direitos individuais e abre caminho para condutas “arbitrĂĄrias” por parte dos agentes estatais.

Ao divergir, Schietti proferiu um voto mais longo, em que disse se preocupar com a mudança da jurisprudĂȘncia da Sexta Turma.

“Estamos voltando aos tempos em que a polĂ­cia, simplesmente alegando a suspeita de alguĂ©m por nervosismo, autorizava, com esse nervosismo, algo absolutamente subjetivo, a abordagem policial”, criticou Schietti.

“Nessa turma eu vejo que estamos caminhando para um retorno a um status quo que consolida um autoritarismo que marca a atuação do Estado perante o indivĂ­duo.”

Schietti afirmou ainda que o tema “afeta a vida de qualquer pessoa que esteja transitando nas ruas e que possa estar sujeita a uma abordagem policial sem a objetividade que se espera, conforme o Estado Democrático de Direito”.

Por esse motivo, o ministro disse que pretende levar a discussĂŁo para a Terceira Seção do STJ, colegiado composto por um nĂșmero maior de ministros e responsĂĄvel por consolidar a jurisprudĂȘncia em questĂ”es criminais.

AGÊNCIA BRASIL